
Parece que a família Falcão quer dominar o mundo. Em “A Máquina”, o diretor João Falcão adaptou para o cinema a peça de sua esposa Adriana Falcão (que co-roteirizou o filme com ele) e reservou o papel do protagonista Antônio para seu filho, Gustavo Falcão. Pra completar, o elenco conta também com Karina Falcão, que deve ser filha do casal (visto que tem o mesmo pré-nome da principal personagem feminina).
Mas tudo isso é besteira. Foi só pra começar o post de forma diferente. “A Máquina” tem uma direção interessante, um roteiro legal e Gustavo não faz feio no papel do cabra cuja história daria um cordel e tanto, tipo aqueles mais vendidos na feira de Caruaru.
Antônio controla o tempo e ‘rebobina’ momentos agradáveis de sua vida para vivê-los novamente. Como os que ele passa com Karina (Mariana Ximenes), menina sonhadora e que é seu objeto de desejo. Só que o desejo de Karina é outro: deixar o vilarejo em que vive para ser “artista” e explorar o mundo. Antônio então decide trazer o mundo até ela para mantê-la ao seu lado.
A trama é quase um ‘De volta para o futuro’ nordestino. Além dos toques de ‘realismo fantástico’, o clima poético predomina. Grande parte do longa foi filmada em estúdio, num esquema meio ‘Hoje é dia de Maria’. A fotografia do Walter Carvalho e a edição característica do ‘núcleo Guel Arraes’ fazem o espectador esquecer que toda aquela cidadezinha é de papelão e eliminam a sensação de se estar assistindo teatro filmado.
Minha principal crítica ao filme é a mania que se tem de querer retratar o povo nordestino como fazem as novelas da Globo: com sotaque forçado (by Glorinha Bettenmuller), uso de palavras e expressões ‘exóticas’ no intuito de fazer rir e elenco cuja estampa não convence na pele de habitantes de uma cidade perdida no meio do sertão pernambucano (Mariana Ximenes é lindíssima e está muito bem no papel, mas não tem cara de nordestina nem aqui nem no Projac!). Isso me lembra o movimento antropofágico, em nova versão. Agora é o povo daqui do ‘sulmaravilha’ que devora os mitos, tradições, maneirismos e características dessa gente arretada lá de riba, para transformá-los em uma linguagem audiovisual idealizada, mais palatável pros consumidores de cultura do sudeste.
Outro ponto a ser discutido é a similaridade da obra em questão com o ‘estilo Jorge Furtado de fazer cinema’. O monólogo inicial, através do qual Paulo Autran (excelente!) começa a contar a história de Antônio, serve como exemplo. Tem aquele didatismo que o diretor-roteirista gaúcho repete desde “Ilha das Flores”. A sombra do ´núcleo Guel Arraes’ também é visível no jeitinho totalmente ‘Lisbela’ da mocinha e em diálogos cíclicos, que vão e voltam jogando com a mesma idéia (‘Auto da Compadecida’, ‘Lisbela e o Prisioneiro’, etc).
Liga não, isso é só cisma da minha parte. Nada disso que escrevi acima tira os méritos do filme e a beleza da história.