segunda-feira, outubro 31, 2005

Cantada

Recebi por e-mail e não sei ainda quem é o autor. Quando souber, dou o crédito.


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Marli, uma garota do cacete


Nunca pensei que fosse dizer isso algum dia, mas achei algo na Internet que é dez mil vezes pior do que qualquer funk carioca que você já tenha tido o desprazer de escutar. O nome da figura é Marli Souza Silva, ou só Marli, a Rainha das Trevas. A julgar pela foto acima, se existisse uma associação internacional de barangas, ela ocuparia os cargos de presidente de honra, vice e suplente ao mesmo tempo e de forma vitalícia.

Mas quem é este filhote de cruz-credo? Segundo a biografia que consta no site ‘oficial’, a criatura dos infernos nasceu “nos cafundós de Ipirá, na Bahia”. Aos 11 anos perdeu a virgindade, casou aos 14 e trabalhou como “domésta”, garçonete e prostituta. Até que resolveu ser artista e utilizou toda a “energia satânica e sexual” que adquiriu lidando na ‘vida’ e com a prática do pompoarismo, pra fazer de sua música “uma arma alucinógena e poderosa”.

O problema é que Marli não tem noção do que seja ritmo. Aliás, Marli não tem a mínima noção de nada. Ela solta seus balidos sempre acompanhados de programações de um teclado daqueles bem safados. Consegue ser pior do que a ‘Madoninha’ Gisele, a capixaba queima-filme que traduziu ao pé da letra as músicas de sua musa, cantou todas com voz de cristão trancado na jaula dos leões e disseminou os petardos pela Internet, anos atrás.

Com 4 álbuns, alguns singles e 1 coletânea lançados só-Deus-sabe-onde, Marli cometeu grandes sucessos, como “Pirulito”, “Ladra de namorados” e “Uma garota do cacete”. Esta última já está rodando o mundo à bordo de mensagens spamódicas, deflagradas por gente que se amarra em propagar a babaquice alheia. Se ainda não recebeu, não tem problema: acesse o site por sua conta e risco , e baixe todas as divertidas aberrações sonoras de Marli. É ouvir e pedir pra morrer. Cult instantâneo!

::: Baixe aqui a músic... perdão, o troço Uma garota do cacete”


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Você baixou, ouviu e ainda não acredita que isso possa ser verdade? Ponto pra você. O site existe, as músicas existem, mas a Marli, provavelmente, não existe. Tem toda a cara de ser mais uma pérola do humor descompromissado e anárquico que só poderia nascer e procriar amparada na liberdade criativa que a grande rede proporciona. Apesar de pipocar em nosso país uns duzentos candidatos à fama por milésimo de segundo, acho muito difícil que a entidade/avatar Marli seja um deles. São várias as pistas de que tudo foi pensado pra rir da cara de quem acredita. As mais descaradas são as fotos obviamente alteradas, a hilária biografia, a menção à banda Portishead e o incrível cover de “Big time sensuality”, da Björk.

quarta-feira, outubro 26, 2005

De volta para a história


Há vinte anos, em 26 de outubro de 1985, o excêntrico cientista Emmett Brown colocou seu amigo, o adolescente Marty McFly, na maior enrascada de sua vida. Neste exato dia, o DeLorean adaptado do Dr. Brown fez a sua primeira viagem no tempo. Isso mesmo! A máquina do tempo mais legal do cinema foi para o passado, mas sua aventura atravessou duas décadas e continua imbatível até hoje.

De Volta para o Futuro foi um marco na vida de muita gente nos anos 80. É daqueles filmes perfeitinhos, de roteiro redondo, que fecha todas as pontas apesar do final aberto. As seqüências ampliaram o universo original com viagens para o futuro (II) e para a época do velho-oeste (III). Tá pra nascer algum produtor/diretor que faça trilogia mais bacana de ficção/aventura do que essa. Palmas para os grandes Robert Zemmeckis e Bob Gale!

Uma nova caixa de DVDs com os três filmes foi lançada esta semana, pra comemorar a data e pra sacanear bonito quem já tinha comprado a caixa anterior. A diferença básica é a inclusão de mais um DVD, lotado de novíssimos extras. Oba!

terça-feira, outubro 25, 2005

Copacabana Palace já era!


O roteiro obrigatório de todo turista estrangeiro que passa aqui pelo Rio de Janeiro é se embrenhar numa favela. Eles sobem naqueles jipes de safári, com os olhos brilhando de tanta alegria e dando uivos de prazer cada vez que avistam um nativo. Seriam alvos fáceis para a rapelagem, se não fossem os salvo-condutos prévios cedidos pelos verdadeiros representantes do poder executivo da cidade: os traficantes.

Nas favelas eles têm o privilégio de babar com a vista deslumbrante, tirar fotos com legítimos espécimes da nossa miséria, aprender a nossa dança tribal (samba ou funk?), passar a mão na bunda de umas mulatas e levar farinha pra cheirar com as garotas de Ipanema que encomendaram via Internet. Armas? Que nada. Isso eles só vão ver mesmo é quando uns vagabundos levarem seus relógios e máquinas digitais no calçadão.

Imagina então se essa gente avermelhada pudesse se hospedar na própria favela? Agora eles podem: a Pousada Favelinha é um empreendimento pioneiro do turismo étnico (posso chamar assim?) do Rio. Ela fica no Morro do Pereirão, ao lado da residência oficial da governadora, em Laranjeiras. Chique no úrtimo.

Nesse morro, traficante não entra mais. O ex-governador Garotinho mandou o BOPE armar a barraquinha lá e dar um fim nos tiroteios que não deixavam a Família Dó-Re-Mi dormir em paz. É uma favela modelo agora. A primeira, a única e, pelo jeito, a última.

Na Pousada Favelinha os hóspedes podem tostar à vontade na laje, se exercitar nas intermináveis escadarias da ‘cumunidadi’, aprender frases novas com os moradores, como “tia, tem um real aê pra mim dá?” e “toma, to-toma, to-toma, toma”, e admirar o pôr-do-sol mais fuderoso do mundo no balcão nobre. Tudo isso por, mais ou menos, uns 25 reais de diária. É baratinho porque a luz é patrocinada pela Light, a água é gentilmente cedida pela Cedae sem custo algum, e a Prefeitura faz o favor de não cobrar nem um centavo de IPTU. Pousada Favelinha é coisa nossa!

segunda-feira, outubro 24, 2005

Alguém sabe dizer o que é normal?


Você não me conhece. Este é o nome do novo CD do Jay Vaquer, um cara que você não conhece mas deveria conhecer. Eu o conheço desde 2001, quando comprei o primeiro lançamento dele, ‘Nem tão são’. Naquela época o clipe de ‘A miragem’ era altamente requisitado na MTV.

A audição de todo CD que compro passa por 3 fases. A primeira é a da ‘Negação’. É a fase em que eu me insulto e penitencio por ter gastado uma quantia de dinheiro qualquer numa bosta de CD. A segunda, ‘Aceitação’, substitui o choro por profunda reflexão acerca das qualidades do CD em questão. Muitas obras de respeito já rodaram nesta fase. Outras caíram na malha fina de uma sub-fase intermediária, conhecida como ‘Abandono’ (também chamada de ‘Limbo’ ou ‘Hibernação’, depende do CD). Os que passam ilesos ou retornam do ‘Abandono’ seguem direto para a terceira fase: ‘Massificação’. E suas faixas não saem mais do meu CD player nem da minha memória musical. O ‘Nem tão são’ do Jay chegou ao final desse processo com louvor, o que garantiu muitos pontos de vantagem para seus dois trabalhos posteriores.

Os talentos vocais de Jay Vaquer não são sobrenaturais, mas têm mãe. Ele é filho de uma das melhores cantores brasileiras, Jane Duboc. Herdou uma bela voz e sabe utilizá-la corretamente, coisa rara no cenário pop nacional. Não é exagero afirmar que o cara dá um banho federal em todo o elenco das 3 edições do ‘Fama’. No quesito ‘Personalidade’ ele dá uma sova em metade dessa galera que toca no rádio e faz uma média com o Faustão aos domingos. Em ‘Inteligência’, então, nem se fala. Pensei por duas horas antes de escrever este post e só achei meia dúzia que chegassem aos pés dele.

Uma pena os dois primeiros CDs não terem vingado como deveriam. Eram independentes e, apesar dos esforços (ele vendeu o carro pra fazer um clipe), faltou quem pagasse o jabá das FMs. No primeiro, destaco ‘Divã’ (em suas duas versões), ‘Outra paisagem’ e o maneiríssimo cover de ‘Pra começar’ (Marina Lima).

No segundo CD, ‘Vendo a mim mesmo’, Jay inventou de aparecer com um visual meio andrógino que não casou muito com a proposta do disco e deve ter assustado algumas pessoas. Injustiça total, pois o que já era bom havia ficado muito melhor. As letras cada vez mais bem sacadas e a sonoridade muito mais apurada. Assim como o primeiro, é poético sem ser hermético. ‘Pode agradecer’ foi a faixa de trabalho, mas acho que se a ensolarada ‘Por nada e por ninguém’ fosse a escolhida, o resultado poderia ter sido outro.

O novo CD segue a trilha dos anteriores, trazendo pérolas pop/rock de qualidade indiscutível. Mesmo agora numa gravadora major (EMI), Jay parece não estar amarrado às concessões comerciais. O repertório, vejam só, é todo dele. Percebi também que ele deu um tempo nos vocalises (os tchara-dup-dunrum praticados pelo Djavan e seu clone Jorge Vercilo). Não que fossem ruins, muito pelo contrário. Mas o trabalho parece estar mais coeso e pronto pra guerra. ‘Cotidiano de um casal feliz’ é genial e já está tocando bastante por aí. A letra esperta (publicada no fim deste post) remete àqueles novos-ricos da Barra. Gente como a gente, não é mesmo?

Se você está procurando algo novo, taí a dica. Garanto que vai ser uma grata surpresa.

Cotidiano de um casal feliz
(Jay Vaquer)

ele manda em tudo, em todos
curte seu poder
e deixa a esposa em casa
pra brincar no treco
de qualquer traveco
em troca de prazer
vai saber porque

e a esposa anda malhada
fez lipoescultura
e a falta de cultura
nunca foi problema
ela tem dinheiro
pra dar e vender
lê Paulo Coelho e seicho-no-ie
vai saber porque

ele guarda no H.D.
fotos de crianças nuas, pra tirar um lazer
curte ver aquilo quando fica só
ela conta os passos que dá no trajeto
entre a terapia e a boca do pó

e até pensa em adotar alguma criatura,
pode ser uma criança ou um labrador
só depende da raça, depende é da cor
que pintar primeiro
ele faz como ninguém a cara de quem não sabe mentir
pode admitir pra ocupar o vazio da relação
mas com uma condição
não quer dar banho, nem
limpar merda o dia inteiro

eles foram ver o show da Diana Krall
que alguém falou que era genial
gritaram uhuuu do camarote
enchendo a cara de scotch

e eles têm escravos
disfarçados de assalariados
diariamente humilhados
e levantam cedo, se arrumam apressados
têm hora marcada pra falar com Deus

alguém sabe dizer o que é normal?
pode parecer tão natural


::: LEIA TAMBÉM >
Fuzarca, o blog do Jay Vaquer
Entrevista com Jay Vaquer

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Uma escolha, uma renúncia

“Todo homem luta com mais bravura por seus interesses do que por seus direitos”.
Napoleão Bonaparte

Votei SIM no referendo de ontem. Nunca gostei de armas, nem dessa gente dodói da cabeça que cresce e vira homem com uma máquina da morte nas mãos. Votei porque não suporto a cultura da violência, que alguns tentam legitimar e disfarçar sob o manto da legítima defesa. Mas meu voto não foi 100% consciente.

Acompanhei com atenção as duas campanhas, cheias de argumentos rasos e estatísticas duvidosas. O pessoal do SIM dizia que era a opção da Paz, como se fosse possível fazer alguém dormir tranqüilo com a proibição da venda de armas. Não adianta, o ser humano é ruim de fábrica. Proíbe qualquer coisa aí que, no minuto seguinte, vão aparecer umas duzentas formas de burlar essa proibição. Eliminem todas as armas do mundo e a pedrada no quengo vai ser a nova maior causa de mortes registrada pela OMS. A Paz que os partidários do SIM querem é um conceito que só existe no mundo das idéias e na cabeça dos tolos.

A galera do NÃO questionava: “se estão querendo tirar esse direito de você agora, imagina o que farão depois?”. O único direito que esses piti-coronéis querem mesmo é o de andar por aí largando o dedo geral, de preferência durante brigas idiotas de trânsito, nas portas de boates ou em vizinhos encrenqueiros. O único direito que eu quero é o de não ser importunado e nem ter o rumo da minha vida alterado por manés armados.

Os argumentos do NÃO que valiam a pena partiram de gente que eu respeito e dou crédito. Aí fez-se o quadro: meu coração clamava pelo SIM, minha razão achava que o NÃO daria um caldo e minha consciência registrava empate técnico. Nos 45 do segundo tempo, o craque pulsante deu uma rasteira na massa cinzenta e cravou 2 na urna.

E nada mudou, nada mudará. O tiroteio diário das 23h não será adiado por falta de quorum e as ‘otoridades’ vão continuar cagando quilos pra você. É a festa da democracia, minha gente!

quarta-feira, outubro 19, 2005

Repescagem

O objetivo primordial do Debukizondeteibou é facilitar a sua vida. Então, se você perdeu os post sobre os filmes que vi no Festival do Rio, aí estão novamente os links. Boa leitura e obrigado pela preferência.

Wallace & Gromit
Crash – No Limite
A Máquina
Cidade Baixa / Cafundó
Crime Delicado
Were the truth lies
Sou feia mas tô na moda
Tapete Vermelho
Noiva e Preconceito / Lady Vingança / Curtas brasileiros

Caso queira ver no seu computador alguns dos melhores curtas exibidos no Festival do Rio, é só acessar o Porta Curtas. Seguem abaixo os links para os filmetes que assisti na telona:

A Cubana
Historietas Assombradas
Eu te darei o céu
Neguinho e Kika
Desejo

E pra terminar de vez essse assunto, uma correção: vi 11 filmes no total, e não 10, como havia afirmado antes.

A bíblia do aprendiz de cinéfilo


“Filmes são como livros. Eu gosto, você não. Você gosta, eu nem vejo.”

Assim começa O Caderno de Cinema de Marina W., livro que ganhei no dia dos namorados e consumi de orelha a orelha em tempo recorde. A autora tem um blog muito legal, que eu visito na moita desde o ano passado. A verdade é que a menina escreve bem que é uma delícia, além de ter um poder de concisão que persigo desde o dia em que acordei achando que sabia escrever. E quer mais? Ela gostou de Inteligência Artificial tanto quanto eu e é fã do David Lynch!

À primeira vista, você pode até pensar que o livro é mais um daqueles almanaques temáticos, do tipo Guia dos Curiosos. Tem bastante informação, na forma de listas, curiosidades, dados históricos, bastidores, minibiografias e trechos de diálogos. Só que além da informação, a Marina reserva espaço precioso para a opinião, sem que o formato mofado da ‘crítica de cinema’ entre em cena. A voz que guia o livro é a da espectadora que chora nas partes que não necessariamente marcaram a história do cinema, ou que ri de felicidade apenas por ter visto um bom filme.

Outra coisa legal é a substituição das estrelinhas ou dos ‘bom’, ‘razoável’ e ‘ruim’, por uma maneira personalíssima e muito mais esclarecedora de cotar os filmes. Em Cidade dos Anjos ela coloca ‘Até o lanterninha chorou’; para Alta Fidelidade, ela recomenda ‘Aumente o som’; e para Os Intocáveis, alerta: ‘Veja com colete à prova de balas’.

O livro tem alguns errinhos que só um cinéfilo enciclopédico e mala como eu é capaz de detectar. Mesmo assim, considero-o imperdível pra você que gosta de ver bons filmes mas não sabe diferenciar Scorcese de Coppola. Ou para você que, quando vai à locadora, não tem outra saída senão aceitar as indicações da balconista entediada (que – pode apostar! - vai te empurrar o novo do Vin Diesel).

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terça-feira, outubro 18, 2005

Poucas & Boas - #001

A segunda temporada da série Lost já começou lá fora. Quem seguiu fielmente a primeira e quase despencou do sofá com a cena derradeira do último episódio, tem duas opções: se enfurnar numa câmara criogênica até março de 2006 (mês em que a AXN vai estrear a temporada por aqui) ou baixar tudo nos Torrent, Kazaa e Emule da vida. Adianto que os três primeiros capítulos trazem grandes revelações e novos mistérios - sem revelar nada, digo apenas que você já pode ir pesquisando sobre I-Ching e o significado da palavra Dharma. Garantia total de que a parte posterior da sua orelha vá ficar infestada de pulgas por, pelo menos, mais uns 8 meses.

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Alguém já notou que a trilha do comercial da Ilha Bela é, hum, digamos, ‘bastante influenciada’ pela música Cannonball, da banda Breeders? Assim é fácil ser criativo, né não?

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Este blog foi gentilmente linkado, mais uma vez, em outro blog. Obrigado Renata!

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Por pura ignorância, troquei a ordem dos nomes do diretor Chan-Wook Park, no post sobre o filme Lady Vingança (lá está Park Chan-Wook). Mas pior que essa foi a mancada da Imagem Filmes, distribuidora de Oldboy, seu filme anterior. No trailer disponível no DVD, o cara é chamado de CHANWOOD PARK (em caracteres na tela e na locução em português)! Triste.

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::: ALVÍSSARAS :::---> Re[corte] Cultural – TVE
Apresentado pelo maluquete Michel Melamed, o programa inova na edição. Como o nome já revela, reportagens, entrevistas, cenas de filmes e videoclipes são literalmente recortados e colados de forma aleatória. Bem alucinado e bem legal. E o interessante recurso faz com que você assista um pouquinho de tudo enquanto espera pra ver mais sobre o assunto que te interessa.

Horários: segunda a sexta-feira as 20h30, com reprise à meia-noite. Melhores momentos aos domingos, às 19h30.

::: IMPROPÉRIOS :::---> Rede TV
É a Rede cujo nariz mais cresce no Brasil. Toda a grade de programação está seriamente comprometida com a prática da lorotagem deslavada. No Super Pop, um paparazzo ‘invade’ as festas e casas de celebridade (e finge se esconder atrás de arbustos ou muros), quando na verdade até o Papai Noel sabe que ele teve sua entrada autorizada. O João Kleber apresenta umas pegadinhas armadas e de quinta, além do ‘Teste de Fidelidade’, onde uma biscate de aluguel finge ser a esposa adúltera de um falso corno, que a fica xingando no palco. Quem assiste até o final merece um certificado timbrado de perda de tempo. O único que se salva é o Pânico, que, por ser humorístico, utiliza a ‘mentira televisiva’ de forma inteligente.

O mistério das placas Toynbee


Nos anos 90 eu andava bastante pelo centro da cidade. Meu primeiro emprego foi numa pequena agência que ficava pros lados da Praça Mauá, em 1994. Na hora do almoço eu gostava mesmo era de bater perna pela Rio Branco e testemunhar a confusão diária daquele lugar mágico, onde martelos caem do céu, figuraças abundam, pivetes ganham o dia e o couro come geral.

Numa dessas andanças lembro de ter percebido algo estranho na esquina da Av. Rio Branco com a Rosário (ou seria a Ouvidor?). Era uma placa branca encravada no asfalto, com uma frase enigmática escrita em inglês e com letras vazadas: “Toynbee ideas in Kubrick’s 2001 resurrect dead on planet jupiter”. Kubrick eu sabia quem era: o genial diretor de ‘2001’, ‘O Iluminado’, ‘Laranja Mecânica’, entre outros. Mas e o tal de Toynbee? O que aquilo queria dizer? Seria um novo “Celacanto provoca maremoto” (frase pichada nos muros cariocas nos anos 70)? Ou seria uma mensagem profética sobre o novo milênio que se aproximava?

O pesado fardo da dúvida se instalou na minha cachola. Anos depois descobri uma nova placa em uma das faixas da Presidente Vargas, esquina com Uruguaiana. Aí eu pirei de vez. Levava todo mundo que trabalhava comigo para ver as tais placas. Arquivo X rolava solto na TV e eu pensava até em conspiração alienígena. A gota d’água foi a descoberta de um site que, além de esclarecer quem era o tal de Toynbee, acrescentou um elemento que elevou o ‘fenômeno’ à enésima potência: existiam placas como aquelas em diversos estados dos EUA e até no Chile e Argentina!

O site ‘What Is It?’, de William O’Neill, reúne todas as sinistras aparições devidamente catalogadas, com fotos e informações complementares. As placas sofrem algumas variações de cor, tamanho e na frase em alguns lugares, mas o conceito é sempre o mesmo. Algumas placas contém até um endereço: “2624 S. 7th. Philadelphia, PA. 19148-4610 USA”. Quem se habilita a mandar um postal?

Recentemente, estava fuçando a web e caiu no meu browser um outro site sobre as placas, de autoria do webdesigner brasileiro Tiago Teixeira. Fiquei surpreso ao descobrir que existe MAIS UMA placa na cidade, que eu nunca tinha visto. Ela fica na Uruguaiana, pertinho daquela da Pres. Vargas. Nessa tem um endereço da Filadélfia, um pouco diferente do que figura na placa gringa.


E o Toynbee, quem é? Provavelmente, trata-se do historiador inglês Arnold Toynbee (1889 – 1975), autor da célebre e mais do que atual frase “O maior castigo para aqueles que não se interessam por política é que serão governados pelos que se interessam". Mas o que isso tem a ver com zumbis jupiterianos? E com o monolito de ‘2001’? Hein?? Hein????

Até hoje o mistério perdura. Ninguém sabe a verdadeira identidade do hippie andarilho que espalhou essas placas nas encruzilhadas das Américas e nem o que o maldito queria realmente dizer com essa frase sem pé nem cabeça. Desde a virada do século não surgem novos exemplares das placas Toynbee. Estaria o misterioso artista plástico entretido com a confecção dos crop circles nas plantações britânicas? Seria este sacana um carioca presepeiro só a fim de zoar?

Devido à ação do tempo e do departamento de obras das prefeituras, as placas estão desaparecendo aos poucos. A da Rio Branco sumiu faz tempo. Se você quiser testemunhar as duas últimas que ainda existem no Rio de Janeiro, corram. Ontem a da Presidente Vargas ainda estava lá, firme e forte. O mapa de localização* é esse logo abaixo.


*Fonte e fotos: site do Tiago Teixeira

::: LEIA TAMBÉM >
Arnold Toynbee, um estudo de história
Artigo do New York Times (25/04/1999)

sábado, outubro 15, 2005

Convite


Depois de problemas técnicos e mais uma facada no meu pobre bolso, estou de volta. Antes que seja tarde, segue abaixo o recado enviado pelo amigo Marcelo Moutinho:

Quero convidá-los para o lançamento do livro "Manual de sobrevivência nos butiquins mais vagabundos", escrito pelo Moacyr Luz e cujo projeto editorial eu coordenei para a editora Senac Rio.

O livro traz 25 crônicas ambientadas em botecos, acompanhadas de ilustrações de Jaguar e entrevistas com boêmios célebres, entre eles Lan, Sergio Cabral, Alfredinho do Bip Bip, Luiz Carlos da Vila, Ruy Castro, Paulão 7 Cordas, Tia Surica da Portela, Roberto Moura e Aldir Blanc.

O lançamento será no próximo domingo (dia 16/10), no Bar Getulio (Rua do Catete, em frente ao Museu da República), a partir das 18h, com chope da Brahma e cachaça Magnífica.

Se você é daqueles que enfia os dois pés na jaca com gosto e é chegado numa birita com selo 'pé sujo' de qualidade, esse é o seu livro! Com tanto bebum reunido em um só livro (Moacyr Luz, Jaguar, Aldir Blanc...), as páginas devem ter até aroma de cana destilada.

Desde já deixo meus parabéns ao Marcelo por mais um lançamento de qualidade. Se der eu apareço por lá. Ou não. Sabe como é, tenho que manter minha fama de antisocial...

terça-feira, outubro 11, 2005

Portuñol, duela a quiem duela


Em resposta ao gringo ‘Talk Like a Pirate Day’, dois brasileiros preocupados com a estagnação das negociações do Mercosul resolveram criar o Dia Internacional de Hablarse Portuñol, uma data especial para que todos nós pudéssemos praticar livremente esse dialeto que é o esperanto da América Latina. Nem os vereadores cariocas seriam tão criativos a ponto de criar uma data comemorativa relevante como essa.

O dia escolhido foi 13 de outubro, dia em que o fictício - pero hombre! - General José Ruelas liderou a revolta dos escravos contra o império espanhol, em 1302. Na página oficial do movimento tem várias dicas pra você que é ‘ixperto’ e não quer ficar de fora desta mobilização nacional niem que la vaca tuessa!

E para comemorar antecipadamente este importante dia, nada melhor do que fazer uma homenagem a um admirável sujeito que dedica sua vida à difusão do portuñol pelo mundo: Vanderley Luxemburgo.

- Lo trenamiento es lo seguiente: yo voy jogar esta buela em tu carecon y usted dá una cabeçiada de vuelta, com toda malemoliência que só nosotros brasileños tiemos, ok?

- Puerra Beckham, usted pára de mariconices e quiebra logo la pierna daquelle macaquito hijo de una puta manca!

- É hermano Robierto, são tantas las emociones que yo bibi...

- Pedalla Robito!!!!!

- Soy, Real Madri yo soy! Voy dar puerrada yo voy!!!

Dessa vez o Gargamel não teve culpa


A TV da Bélgica está veiculando o filme de uma campanha da Unicef que visa arrecadar fundos para a reabilitação de crianças ex-soldados no Burundi. Filme bem chocante, diga-se de passagem.

Não, não tem imagens de crianças mutiladas ou cenas de batalha protagonizadas por pirralhos. O filme pisa na ferida de forma mais eficiente e contundente. E atinge em cheio o imaginário de quem já foi criança e agora é público-alvo, ao mostrar violentas cenas de bombardeio num lugar sagrado e que todo mundo com mais de 20 anos conhece bem: a aldeia dos Smurfs.

Conheço muita gente que sempre detestou os descamisados duendes. Já ouvi até barbaridades como a idéia de que eles eram apenas alucinações do riponga careca Gargamel, que lambia aqueles cogumelos vermelhos e depois queria curar a larica correndo atrás dos tampinhas azuis. Mas, mesmo que você ache que o Gênio é boiola, que a Smurfete é um traveco (única Smurf mulher numa aldeia onde só tem homens? Tá bom...) e que o Robusto dava uns pegas no Vaidoso de vez em quando, é impossível não ficar horrorizado com o filme da Unicef.

Nele, os inocentes Smurfs estão cantando e dançando quando são surpreendidos por bombas que caem do céu. Há muita correria e desespero. Muitos Smurfs morrem e suas casas pegam fogo. No final, vemos um bebê-Smurf (mais raro que filhote de pombo) chorando desolado no meio da aldeia, completamente devastada. A assinatura: “Não deixe a guerra afetar a vida de crianças”.

Sinistro é pouco...


::: LEIA TAMBÉM > Os Smurfs e o comunismo

::: BAIXA ESSA >
Gargamel praguejando contra os Smurfs (.wav)

segunda-feira, outubro 10, 2005

Acabou-se o que era doce

Finito. O Festival do Rio já virou lembrança. Infelizmente, vi menos filmes do que havia planejado. Só 10 de uma lista de 16. Mas dos 6 que acabei ignorando, só lamento não ter visto Carreiras do Domingos Oliveira, o nosso Woody Allen. Gosto muito de seus filmes desde que vi Amores num festival passado. O cara filma com uma alegria rara e faz bons filmes com pouca grana, atores de porta de botequim e diálogos inteligentes - o que muita gente não consegue com orçamentos milionários.

Vamos então às resenhas que estavam faltando:


::: Noiva e Preconceito ::: Apesar de parecer, não é produto típico de Bollywood, a poderosa indústria do cinema indiano. É uma adaptação musical de Pride And Prejudice (livro de Jane Austen) produzida pelos britânicos e com foco numa família da paupérrima cidade indiana de Amristar. De acordo com a tradição local, os Bakshi precisam desencalhar suas quatro jovens e belas filhas, arranjando-lhes casamentos. De preferência com noivos abastados que os resgatem da beirada do precipício financeiro. Só que as garotas, da era da internet e da rave, não concordam com essa visão atrasada.

Seguindo à risca o clássico de Austen, entra em cena o Mr. Darcy, americano cheio da grana que bate de frente com a idealista Lalita (Aishwarya Ray, Miss Mundo e bastante parecida com a Juliana Paes). O choque cultural é uma das molas do roteiro, criticando a ignorância dos estrangeiros quanto às tradições e a cultura dos países do terceiro mundo. Apesar do tom meio amadorístico dos números musicais, destaco as canções empolgantes da trilha sonora e as ótimas participações de Nitin Ganatra (como o atrapalhado Mr. Kohli) e Naveen Andrews, da série Lost.


::: Lady Vingança ::: Excelente exercício narrativo de Park Chan-Wook, diretor sul-coreano do cultuado Oldboy (que ainda não vi). Uma mulher recém-saída do xilindró - depois de 13 anos comendo o pão que o Jiraya amassou - põe em prática seu minucioso plano de vingança. Para isso ela conta com a retribuição dos favores que cedeu às suas ex-colegas de cela. O alvo da vingança é o cara que a forçou a confessar o crime que ela não cometeu: o assassinato de um garotinho, seqüestrado por ambos.

O roteiro é engenhoso e reserva uma surpresa que modifica e amplia radicalmente o plano original da protagonista. As imagens de Chan-Wook nem sempre são de fácil digestão. Para absorver bem é preciso ter tomado todas as vacinas contra a crueldade humana disponíveis no mercado. Fácil para quem mora no Rio de Janeiro.

Mesmo assim, ainda me espanto com pessoas que acham engraçadas as cenas mais macabras de um filme como esse. O cara tá lá na tela, prestes a torturar alguém, e o sujeito na platéia engasgando com a pipoca de tanto rir. Banalização da violência? Sublimação voluntária da realidade? Sei que cinema é fundamentalmente entretenimento, mas será que é normal arreganhar as cáries toda vez que uma cena violenta é projetada? Fico com a moral do filme de Chan-Wook: ninguém presta. Inclusive eu e você que está lendo isso agora.


::: Os curtas ::: Este ano os curtas brasileiros passaram antes dos filmes da Premiére Brasil e de alguns estrangeiros. Uma boa iniciativa da organização do Festival. Tive sorte de ter visto bons filmetes, como Eu te darei o céu (divertido encontro entre uma solteirona e um garoto de programa) e Historietas Assombradas (animação metade 3D, metade stop-motion, sobre lendas do folclore brasileiro).

Dos outros não gostei tanto (Desejo, Neguinho e Kika, A Cubana e Manual para atropelar cachorro), mas são bons exemplares de uma nova safra de cineastas com a cabeça lotada de referências e que buscam nelas o seu estilo perdido.


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Ufa! Agora que tudo virou abóbora, o melhor a fazer é arquivar o que restou de energia para o Festival de 2006, tomar vergonha na cara e começar a correr atrás de um emprego...

sexta-feira, outubro 07, 2005

Réquiem para um Jeca


Tapete Vermelho, de Luiz Alberto Pereira, é um filme simples e honesto como um caipira. É também uma grande homenagem a Mazzaropi, incorporado por Mateus Nachtergaele com mediúnica semelhança (gestos, voz, modo de andar... tudo!). Confesso que, quando ele abriu a boca pela primeira vez no filme, o meu detector de bombas soou forte. Mas no minuto seguinte o medo da caricatura passou e consegui enxergar uma bela e verossímil interpretação.

O roteiro narra as aventuras de Quinzinho, uma verdadeira cria do mato, em busca de um cinema que esteja passando algum filme do Mazzaropi. Na estrada, ele e sua família (a ‘muié’ Zulmira, o ‘fio’ Neco e o burro Policarpo) vão batendo de frente com a dura realidade brasileira, passam por apuros num assentamento dos sem-terra e encontram até com o tinhoso em pessoa. A religiosidade e o misticismo do povo rural é bem explorada, principalmente na figura da benzedeira Zulmira (Gorete Milagres no tom ideal, mil degraus abaixo da sua caricata Filó).

O roteiro é bem amarradinho e, além de dar umas pinceladas ‘sociais’ na história, ainda reserva espaço para alfinetar merecidamente essas igrejas-pega-otários que se dizem evangélicas e que constroem templos estéreis em salas de cinema.

Mateus está engraçadíssimo no papel do Jeca Tatu cover. Destaco as hilárias seqüências em que ele tem que passar uma cobra coral entre os dedos pra ser um bom violeiro, quando debocha do modo de falar de um árabe e, quase no final, quando se enfurece com os funcionários do cinema.

Tapete Vermelho é cinema popular. Arroz com feijão. Pobre de recursos, mas limpinho. Não pratica cambalhotas estéticas e nem é estilizado como A Máquina. Mas se revela muito mais verdadeiro e autêntico ao mostrar tipos mais brasileiros do que os nordestinos de butique do filme de João Falcão. E a surpresa de ver o Odeon inteiro cantando junto ‘Romaria’ (“Sou caipira, pira, pora / Nossa Senhora de Aparecida / Ilumina a mina escura e funda /o trem da minha vida”) já valeu a sessão.

quinta-feira, outubro 06, 2005

Imagem não é nada, edição é tudo

Quantas vezes você viu um trailer qualquer no cinema, achou o filme bacana e, quando assistiu, constatou que não era tudo aquilo que você havia imaginado? Isso acontece porque o trailer de um filme é sua principal peça de divulgação e, por isso, é produzido com a finalidade de seduzir públicos com perfis pré-definidos pelo departamento de marketing do estúdio ou produtora.

É através do trailer que os espectadores vão ter o primeiro contato sensorial e conceitual com o filme. E encontrar os elementos de identificação e de atração (ou de repúdio), que podem ser o tema, a abordagem, o ritmo, o tipo de humor, o elenco, etc. Ou seja: o filme pode ser uma bosta, mas se o trailer é bom e tem tudo o que você adora ver na tela do cinema, ele te pega de jeito pelo gasganete.

Para exemplificar essa ‘manipulação’, surgiram no território livre da internet alguns trailers de filmes clássicos, editados de forma a subverter completamente suas histórias e seus gêneros. Por exemplo, a obra-prima de Robert Wise (ver este post), West Side Story, ganhou um trailer que o transforma em filme-B de zumbis, estilo George Romero. Titanic de James Cameron virou filme de terror (lembra até o trailer de Água Negra). E o assustador O Iluminado, de Stanley Kubrick, vira comédia na linha de Melhor é Impossível (toca até ‘Solsbury Hill’ do Peter Gabriel, que costuma bater ponto nos trailers de filmes alto-astral). Tudo isso utilizando apenas os recursos de edição (e alguns efeitos especiais, como no caso dos olhos luminosos dos mortos-vivos de West Side Story). Genial!

Trailer reeditado de West Side Story (ou ‘Terror, Sublime Terror’)
Trailer reeditado de Titanic (ou ‘O Transatlântico Assombrado’)
Trailer reeditado de O Iluminado (ou ‘Minha Doce Vida de Escritor’)

Para copiar os trailers para seu computador, clique com o botão direito do seu mouse sobre o link e selecione ‘Salvar Destino Como’. Aí é só escolher o diretório para onde quer copiar e clicar em ‘OK’.

quarta-feira, outubro 05, 2005

É feio mas tá na moda


Em primeiro lugar, preciso dizer que não gosto de ‘funk carioca’. Reconheço a legitimidade do movimento como expressão de população favelada, a originalidade da sua gênese (bem ao estilo do brasileiro, que mistura X e Y pra gerar Z) e até deixo passar o discurso de alguns que dizem ser uma manifestação cultural importante. Mas não consigo tirar da cabeça a idéia de que este “estilo musical” é, fundamentalmente, a trilha sonora do tráfico. É cristalino de tão evidente: tá na linguagem, no gestual, na excitação catártica, no ‘duplo-sentido-que-na-verdade- é-um-só’ tendencioso e na arregimentação ideológica de uma manada de jovens idiotizados de todas as classes.

Quem não lembra da imbecil da Xuxa, com sua inocência estrategicamente planejada por sua equipe de marketing, cantando e propagando para o Brasil pérolas como “Tá dominado!” (que é como uma facção comemora quando toma a boca alheia) e “Vou passar cerol na mão” (passar o rodo em alguém, seja bandido, trabalhador, policial, etc). A linguagem é uma das principais armas da dominação cultural. É por isso que nós falamos hot-dog, approach, downsizing, drive thru, branding e outras besteiras em vez de utilizar as correlatas em português.

Antes que você pense que eu sou radical, releia as primeiras quatro linhas do parágrafo inicial. Acrescento também que sou contra qualquer forma de preconceito. Os MCs e Bondes (outra palavrinha saída do dicionário do tráfico), apesar de fazerem uma música rasa, repetitiva e com um vocabulário limitadíssimo, têm todo o direito de se expressar livremente. Público pra isso tem, e aos montes. Fazer o quê, gosto não se discute.

O filme? Ah, sim. Isso tudo foi pra dizer que vi Sou feia mas tô na moda, documentário de Denise Garcia. Preferências pessoais à parte, acho que o resultado final não foi tão satisfatório assim. Se a idéia inicial era focar sobre as ‘tchutchucas’ e ‘cachorras’ do funk, ela foi diluída na tentativa de contar as raízes do movimento, que, por seu lado, não foi tão aprofundada nem esclarecedora. Ficou meio samba-do-funkeiro-doido, sem um objetivo definido. Culminou com a chegada do DJ Marlboro (o cara mais articulado do movimento) à Europa. O povo gostou, pois foi bastante aplaudido no final.


Depois rolou o debate na tenda da Cinelândia. Não poderia perder isso de jeito nenhum. Na mesa: a diretora, Deise da Injeção, Mr. Catra, MC Frank, MC G3 e o jornalista Silvio Essinger, que espertamente capitalizou em cima da popularidade do movimento com seu livro “Batidão”.

Todos foram unânimes em defender a inocência dos inspirados letristas dos chamados ‘proibidões’. “Isso é a realidade da gente. É a favela cantando para a favela. Não é apologia ao crime, blá, blá, blá”. Então o cara faz uma letra dessas, tipo ‘Bonde do 157’ (veja no final do post) e diz na cara dura que não tá incentivando e enaltecendo práticas criminosas? Sei...

O pior foi um deles dizer que o funk é o gênero mais sincero da música, no sentido de que fala abertamente tudo o que até os mais ousados, tipo forró e axé, não têm coragem de cantar. Então porque não assumem a vocação para a putaria, ao invés de ficarem dizendo que fazem ‘funk sensual’? Hein? Hein?

Esse assunto dá pano pra uma mangueira inteira. Em breve volto com ele.

*Bonde 157 – MC Frank

Não se mexe, não se mexe
Na Chatuba é 157
Não tira a mão do volante
Não me olha e não se mexe
É o bonde da Chatuba, do artigo 157

Vai, desce do carro, olha pro chão, não se move
Me dá seu importado, que o seguro te devolve
Se liga na minha letra, olha nós aí de novo
É o Bonde da Chatuba, só menor periculoso

Audi, Civic, Honda, Citroën e o Corolla
Mas se tentar fugir
Pá! Pum! Tirão na bola ( = cabeça)
Na Chatuba é 157

Aê, parado, ninguém se mexe...
Nosso bonde é preparado, mano
Puta Que Pariu
Terror da Linha Amarela e da Avenida Brasil
Nosso bonde é preparado
Não tô de sacanagem
Um monte de homem-bomba
No estilo Osama Bin Laden

Em tempo: 157 é o artigo do Código Penal Brasileiro que trata sobre o crime de roubo.


::: LEIA TAMBÉM > A volta do funk consciente (matéria da Revista Época)

segunda-feira, outubro 03, 2005

Onde a verdade repousa


Acabo de chegar da sessão de Were The Truth Lies, do diretor mezzo-canadense, mezzo-egípcio, Atom Egoyan. Fiquei literalmente sem palavras. O que escrever sobre um filme perfeito?

Suspeitas recaem sobre mim: sou um mega fã do cara. Desde que vi O Doce Amanhã, em 98, e fiquei sentado no cinema com cara de panaca até o final dos créditos, que tal cena não se repetia. Depois vieram “Exótica”, “Felicia’s Journey”, “Ararat”... Nesses não rolou a cara de panaca. Apenas um breve filete de baba bovina caindo do canto da boca.

É difícil explicar o impacto dos seus filmes. Só vendo mesmo pra saber. A narrativa é fragmentada e cada elemento da história é revelado no momento apropriado. Geralmente, um grande segredo ou um pequeno detalhe capaz de mudar o mundo de alguém é mostrado no final, sendo que, cronologicamente, tal segredo ou detalhe pode estar no início da história, ou no meio, ou sei lá onde. Seu Egoyan sabe manipular o tempo e o espaço como poucos. E sabe imprimir na tela a sordidez e a perversão do ser humano como ninguém. Ele é o roteirista que eu quero ser quando crescer.

Dessa vez a história original não é dele – é adaptada do livro homônimo de Rupert Holmes. Uma jovem jornalista (Alison Lohman) tenta entrevistar, em plenos anos 70, uma famosa dupla de apresentadores de TV dos anos 50 (tipo Dean Martin e Jerry Lewis), interpretados por Kevin Bacon e Colin Firth. Contar mais do que isso é estragar o prazer de quem vai assistir. Basta dizer que a trama envolve também um Teleton contra a pólio, um mafioso, muito sexo, drogas, mentiras, um segredo, um crime e apenas uma verdade. Tudo isso brilhantemente embaralhado pelo roteiro primoroso e com a direção magnífica do Atom Egoyan.

Cena lisérgica em destaque: a Alice - do País das Maravilhas - seduzindo a jornalista. O diretor já tinha feito uma referência a histórias infantis em O Doce Amanhã (O Flautista de Hammelin, num contexto incestuoso). Quase baixou um David Lynch na hora!

E termino com uma boa notícia: li n’O Globo que o filme foi comprado para lançamento comercial no Brasil. Só não se sabe se o lançamento vai rolar nessa ou na próxima encarnação. Rezem.

Bang-Bang


A barraca do referendo já está armada. A propaganda do “Sim” e do “Não” já come solta na TV. Ainda não tomei partido, mas gostaria de colocar umas questões aqui.

A Veja lançou uma matéria repleta de argumentos para justificar o “Não”, mas ainda não li. Mas já vi que esse blá-blá-blá da bancada de parlamentares que têm o rabo-preso com a indústria das armas (“querem tirar o seu direito de escolher se quer comprar uma arma ou não”) é bem idiota.

Espero que você que esteja lendo isso saiba que DESARMAMENTO é uma coisa. PROIBIÇÃO DA FABRICAÇÃO E COMÉRCIO de armas é outra. O revólver que você tem no fundo do armário do seu quarto não será confiscado. Portanto, as chances de diminuírem as estatísticas de acidentes domésticos causados por arma não são muitas. Os crimes passionais também não serão afetados. Afinal, ninguém vai proibir a venda de facas de cozinha e canivetes.

Se quiser você pode votar “Sim” à vontade no dia 23 de outubro. Mas tenha em mente que as balas perdidas, os tiroteios diários, as blitzes de traficantes, a agressividade nos assaltos e a insegurança nas ruas e na sua casa vão continuar os mesmos. Não é proibindo a venda de armas que vão acabar com a violência. Bandido que é bandido não compra suas armas em lojas.

Por isso acho esse referendo mais do que inútil. Seria melhor se a pergunta fosse “A polícia brasileira deveria ser mais eficiente no combate ao tráfico de armas e drogas no Brasil?”

Pra finalizar, a letra de uma musiquinha que recebi via e-mail:

O REVÓRVE DO TROPEIRO
Piriska Grecco

Seu Delegado vim trazer meu revorvinho,
Que eu ganhei do meu padrinho
Quando me tornei rapaz.
E há 30 anos mora na cintura, escorando a vida dura
De tropeiro e capataz.
Com esse revórve nessas roça do destino
Já salvou muito teatino de apanhar sem merecer,
Botou respeito sem precisar falar grosso,
Com ele muito arvoroço
Não deixei acontecer.

Mas deu no rádio
Que ninguém pode andar armado,
E no rumo do povoado
Vim tirando a conclusão,
Que fiquei louco ou não entendi a notícia,
Pois pensei que a polícia
Desarmava era ladrão.

Seu delegado, se um ladrão bater na porta
Devo fugir pela outra?
Me "arresponde", sim senhor!
E se um safado me desrespeitar uma filha,
Quem vai defender a família
Do homem trabalhador?

É muito fácil desarmar quem é direito,
Quem tem nome e tem respeito,
Documento e profissão,
Muito mais fácil que desarmar vagabundo,
Desses que andam pelo mundo fazendo mal-criação.

Pra bagunceiro
O País tá encomendado, o povo tá "desdomado"
E quem manda faz que não vê,
Nosso governo,
Quem tem que prender não prende,
Não vigia, não defende
Nem deixa ser defender!

"Ô mundo véio, que tá virado,
Seu Delegado, preste atenção:
Vê se devorve o revórve do tropeiro,
Vai desarmar desordeiro
E deixe em paz o cidadão!"

Pintura íntima


Beto Brant fez um filme cabeça. Sim, o responsável pelas pedradas “Os Matadores”, “Ação Entre Amigos” e “O Invasor” (três exemplos recentes de que é possível produzir no Brasil bons filmes do gênero ‘policial-dramático com toques de suspense’) fez Crime Delicado, um filme cabeça. Isso é bom? É ruim? Não sei, só sei que foi assim.

O meu eu-crítico ficou meio chocado. A experiência de ser surpreendido – ou seja, esperar uma coisa e levar outra – foi traumática. O meu eu-espectador dormiu profundamente.

Um crítico de teatro (Marco Ricca) conhece no bar uma mulher deficiente que, tal como o Dirceu para o Jefferson, desperta os seus ‘instintos mais primitivos’. Só que a perneta tem uma relação meio de concubinato com um artista plástico mais velho, que a usa como modelo para suas telas pornográficas. Viu o que eu disse? Lendo essa sinopse você até pode pensar que se trata de um bom e velho filme do Brant. Mas não é.

Mesmo assim, não posso ser injusto com o mais novo trabalho do competente diretor. Só não tem a mesma dinâmica dos filmes anteriores. Talvez não tenha dinâmica alguma. Certas seqüências, arrastadérrimas (como os quase 20 minutos em que acompanhamos o processo INTEIRO de criação de um quadro), não justificam os fins. Mas nada lá é sem sentido. Os fãs de Julio Bressane vão gostar.

Atualizando: acabo de encontrar este resumo do livro ‘Um Crime Delicado’, de Sérgio Sant’Anna, no qual o filme foi baseado. Vale a pena ler!


Índice remissivo

Este blog ainda nem completou um mês e já tem mais de 200 visitas registradas pelo Site Meter (que começou a contar só a partir do dia 15/09). Bom, muito bom. Tem muita gente nova vindo aqui, além dos amigos e da galera que conheço. Obrigado a todos.

Então, pra quem tá chegando agora e não tem tempo de ficar vasculhando em arquivos de blog pra ler posts antigos, vou facilitar o trabalho e colocar abaixo os links dos posts que imagino ser os mais interessantes:

Novidade de Seinfeld
CD pra aporrinhar vizinhos
Huckabees e sua filosofia do nonsense
Origem do nome do blog
“Iu-huu, vou comer a tia do Batman!”
Show do Pato Fu

Se quiser ler tudo o que foi publicado no mês de setembro, clique aqui.

Dom Lázaro é cosa-nostra!


No post anterior, escrevi que a família Falcão queria dominar o mundo (ou melhor, o cinema brasileiro). Só que depois de ter visto Cidade Baixa e Cafundó, percebi que o ator Lázaro Ramos não só já tomou conta desse mundo, como instaurou uma ditadura absolutista.

O cara tá mesmo em todas. Até em A Máquina ele apareceu (talvez pra espionar, conspirar e tomar de assalto o poder dos Falcão). Ontem, inclusive, tava lá ele no Fantástico, flutuando em um dos aviões da NASA (e, quem sabe, aproveitando a ida aos ‘isteites’ pra construir alianças escusas com os ianques).

Deixando o brizolismo de lado, preciso dizer que o negão manda muito bem! Em Cidade Baixa, faz dupla com seu conterrâneo Wagner Moura (outro que impressiona em tudo o que faz). O Filme é a velha história do triângulo amoroso: dois amigos se apaixonam por uma mesma mulher que abala as estruturas de ambos e põe a amizade em xeque. O pano de fundo é o submundo de Salvador. O mais próximo de cartão-postal que vemos na tela é o Elevador Lacerda. De resto só inferninhos, botecos, vielas imundas e barcos sucateados.

No início uma seqüência chocante e, digamos, metafórica: uma briga de galos. Abre parênteses: é uma prática detestável, digna de quem não respeita a vida (como um certo publicitário arrogante e corrupto que todos conhecem), mas que no filme é uma cena extremamente necessária para mostrar que, apesar da natureza pacífica dos personagens, eles podem se ‘estranhar’ quando atiçados por forças externas (a descoberta do amor). E nos créditos o diretor garantiu que ‘nenhum animal se feriu durante as filmagens’. Ponto para ele, que conseguiu filmar uma seqüência bem realista. Fecha parênteses.

Destaco também as cenas do assalto à farmácia e o pega-pra-capar entre os dois amigos. A tensão e a autenticidade são duas coisas que Cidade Baixa dá aos montes para o espectador. Alice Braga está muito bem, mas não sei se por ser boa atriz ou por ter sido ‘contaminada’ pela competência da instituição dramática Lázaro-Wagner e pela boa mão do diretor Sérgio Machado. O que fica mais do que claro na tensa e brilhante seqüência final (que, pra raiva de muitos, é daquelas que não concluem a história de forma tradicional). Impressionante. Pra mim, Cidade Baixa está em alta.

Cafundó é uma fantasia biográfica que conta a história da mistureba religiosa surgida no Brasil, através da trajetória do ex-escravo João de Camargo (que não é mais um dos filhos de Francisco). O filme é honesto em suas intenções e Paulo Betti, dirigindo pela primeira vez (o que fica perceptível em muitos momentos), segura bem a produção, principalmente nas horas em que precisa esconder as evidências de um baixo orçamento.

E não é que o Lázaro também está num curta? Desejo passou antes de Cidade Baixa. Mais pra frente vou comentar todos os curtas que vi no Festival em um post só. Inté.