sexta-feira, outubro 07, 2005

Réquiem para um Jeca


Tapete Vermelho, de Luiz Alberto Pereira, é um filme simples e honesto como um caipira. É também uma grande homenagem a Mazzaropi, incorporado por Mateus Nachtergaele com mediúnica semelhança (gestos, voz, modo de andar... tudo!). Confesso que, quando ele abriu a boca pela primeira vez no filme, o meu detector de bombas soou forte. Mas no minuto seguinte o medo da caricatura passou e consegui enxergar uma bela e verossímil interpretação.

O roteiro narra as aventuras de Quinzinho, uma verdadeira cria do mato, em busca de um cinema que esteja passando algum filme do Mazzaropi. Na estrada, ele e sua família (a ‘muié’ Zulmira, o ‘fio’ Neco e o burro Policarpo) vão batendo de frente com a dura realidade brasileira, passam por apuros num assentamento dos sem-terra e encontram até com o tinhoso em pessoa. A religiosidade e o misticismo do povo rural é bem explorada, principalmente na figura da benzedeira Zulmira (Gorete Milagres no tom ideal, mil degraus abaixo da sua caricata Filó).

O roteiro é bem amarradinho e, além de dar umas pinceladas ‘sociais’ na história, ainda reserva espaço para alfinetar merecidamente essas igrejas-pega-otários que se dizem evangélicas e que constroem templos estéreis em salas de cinema.

Mateus está engraçadíssimo no papel do Jeca Tatu cover. Destaco as hilárias seqüências em que ele tem que passar uma cobra coral entre os dedos pra ser um bom violeiro, quando debocha do modo de falar de um árabe e, quase no final, quando se enfurece com os funcionários do cinema.

Tapete Vermelho é cinema popular. Arroz com feijão. Pobre de recursos, mas limpinho. Não pratica cambalhotas estéticas e nem é estilizado como A Máquina. Mas se revela muito mais verdadeiro e autêntico ao mostrar tipos mais brasileiros do que os nordestinos de butique do filme de João Falcão. E a surpresa de ver o Odeon inteiro cantando junto ‘Romaria’ (“Sou caipira, pira, pora / Nossa Senhora de Aparecida / Ilumina a mina escura e funda /o trem da minha vida”) já valeu a sessão.

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